Pesquisadores brasileiros desenvolveram e testaram um exame de sangue capaz de detectar o Alzheimer com mais de 90% de precisão, superando o método atualmente considerado padrão, o exame de líquor. A descoberta, publicada em duas pesquisas recentes, representa um avanço significativo no diagnóstico precoce da doença e pode transformar o tratamento da demência em todo o país.
O estudo principal, conduzido por cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) com apoio do Instituto Serrapilheira, analisou amostras de 59 pacientes atendidos em clínicas de memória de Porto Alegre. Os participantes incluíam pessoas com diagnóstico confirmado de Alzheimer, demência vascular e indivíduos sem sinais de demência. Todos realizaram exames cognitivos, coleta de sangue e líquor, além de ressonância magnética para complementar a análise.

Os resultados apontaram a proteína p-tau217 como o principal biomarcador capaz de distinguir indivíduos saudáveis daqueles com Alzheimer. Segundo os pesquisadores, esse marcador sanguíneo apresentou desempenho superior em comparação a outros parâmetros analisados, mostrando alto potencial para uso em diagnósticos clínicos.
Em paralelo, uma revisão internacional publicada no periódico Lancet Neurology reforçou as conclusões do estudo brasileiro. O trabalho, que reuniu dados de mais de 110 pesquisas e cerca de 30 mil pacientes, confirmou que a p-tau217 é o biomarcador mais promissor para identificar o Alzheimer por meio do sangue. O artigo contou com a colaboração de 23 cientistas, entre eles oito brasileiros, incluindo os pesquisadores Eduardo Zimmer e Wagner Brum, da UFRGS.
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Diagnóstico precoce e novas perspectivas de tratamento
O Alzheimer é uma das doenças neurodegenerativas mais prevalentes no mundo, caracterizada pela perda progressiva da memória e de outras funções cognitivas. O diagnóstico precoce é fundamental para retardar o avanço dos sintomas e aumentar a eficácia dos tratamentos disponíveis.
De acordo com os pesquisadores envolvidos no estudo, o novo exame de sangue tem o potencial de ampliar a chamada “janela terapêutica” — período em que as intervenções médicas podem ter maior impacto. A detecção antecipada da proteína amiloide, relacionada ao início da doença, é uma das principais dificuldades enfrentadas atualmente.
Com a nova metodologia, será possível identificar a presença da proteína em fases iniciais, antes que ocorra a morte de neurônios — processo irreversível e responsável pelo comprometimento cognitivo. Dessa forma, médicos poderão adotar estratégias preventivas e tratamentos personalizados com maior eficiência.

Caminho para o SUS
Além do avanço científico, os resultados do estudo abrem perspectivas para a incorporação do exame no Sistema Único de Saúde (SUS). O grupo liderado por Zimmer coordena a Iniciativa Brasileira de Biomarcadores para Doenças Neurodegenerativas (IB-BioNeuro), que tem como objetivo implementar testes sanguíneos para diagnóstico de demências como política pública no país.
Na rede privada, exames semelhantes já são oferecidos, como o PrecivityAD2, desenvolvido nos Estados Unidos. Embora apresente alta precisão, o custo elevado — que pode chegar a R$ 3,6 mil — limita o acesso da maioria dos pacientes. Por isso, a criação de uma alternativa nacional e gratuita é vista como essencial para democratizar o diagnóstico.
Os pesquisadores destacam que o exame de sangue tem vantagens logísticas importantes em relação ao teste de líquor, que exige punção lombar e infraestrutura hospitalar específica. O novo teste, por outro lado, é escalável, simples de aplicar e pode ser realizado em qualquer unidade de saúde do país.
Perspectivas para o futuro
A descoberta representa um marco na pesquisa sobre Alzheimer no Brasil e pode colocar o país entre os pioneiros no uso de biomarcadores sanguíneos para diagnóstico de demências. Além de facilitar o acesso, a nova tecnologia deve contribuir para a redução de custos e para a melhoria da qualidade de vida de pacientes e familiares.
O desafio agora é transformar o avanço científico em realidade clínica. Para isso, será necessário ampliar os testes em diferentes populações, validar os resultados em larga escala e estabelecer protocolos de uso no sistema público. Com o apoio de instituições de pesquisa e políticas públicas de inovação, o exame de sangue para Alzheimer pode se tornar, em breve, uma ferramenta de rotina nos consultórios e hospitais brasileiros.
O avanço reforça o papel da ciência nacional na busca por soluções que tornem o diagnóstico mais acessível, humanizado e eficiente, abrindo novas possibilidades para o tratamento da demência no Brasil e no mundo.
Fonte: CNN Brasil









