
Apesar dos avanços tecnológicos e da regulamentação da prática da telemedicina no Brasil, o atendimento médico online ainda é realidade em apenas 10% das cidades do país, aponta levantamento. O dado, divulgado pela Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), revela um panorama preocupante sobre a inclusão digital no setor da saúde, especialmente em regiões que mais carecem de médicos e especialistas.
O levantamento destaca que a escassez de infraestrutura básica é o principal entrave para a expansão da teleconsulta. Muitos municípios ainda não possuem computadores suficientes, internet de alta velocidade ou suporte técnico nas unidades de saúde para realizar esse tipo de atendimento. Como consequência, a população segue enfrentando longas filas de espera, mesmo para casos simples que poderiam ser resolvidos à distância.
Regiões mais afetadas são as que mais precisam
Segundo, levantamento, o paradoxo é evidente: as regiões que mais poderiam se beneficiar da telemedicina são justamente as que menos têm acesso a ela. Norte, Nordeste e Centro-Oeste enfrentam o chamado “vazio assistencial”, com a ausência de médicos em especialidades como oftalmologia, ortopedia, neurologia e cirurgia geral. A teleconsulta surge como alternativa viável para suprir parte dessa demanda, permitindo que médicos atendam pacientes remotamente, diretamente das unidades básicas de saúde (UBS).
Nessas localidades, o atendimento online evitaria deslocamentos desnecessários e desafogaria as filas do Sistema Único de Saúde (SUS), direcionando os atendimentos presenciais para casos mais complexos. Ainda assim, a falta de equipamentos e conectividade impede a plena utilização dessa tecnologia, criando um ciclo de exclusão que perpetua as desigualdades regionais em saúde.

Telessaúde entra no radar do governo
Reconhecendo a importância estratégica da saúde digital, o Ministério da Saúde incluiu a telessaúde no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC da Saúde), com previsão de investimento de R$ 300 milhões. O objetivo é modernizar a estrutura das unidades públicas, promovendo a digitalização dos serviços e integrando plataformas tecnológicas de atendimento.
Com esse reforço, estima-se que o tempo de espera para atendimentos no SUS possa ser reduzido em até 30%. A iniciativa busca democratizar o acesso aos cuidados médicos e, ao mesmo tempo, aumentar a eficiência do sistema público de saúde.
Legislação já permite a prática em todo o país
A telemedicina está legalmente respaldada no Brasil desde 2022, por meio da Lei nº 14.510 e da Resolução CFM nº 2.314, que regulamentam a atuação médica em ambiente virtual. A legislação estabelece critérios éticos, técnicos e operacionais para garantir a segurança e a qualidade dos atendimentos à distância.
Durante a pandemia de Covid-19, o uso da telemedicina se multiplicou, com crescimento de 372% e mais de 7,5 milhões de consultas registradas em todo o país. A emergência sanitária forçou a adaptação dos serviços e revelou o potencial da tecnologia como ferramenta essencial no cuidado à saúde.
Agora, o desafio é fazer com que os avanços conquistados naquele período se tornem permanentes e acessíveis para toda a população.
Experiências positivas reforçam potencial
Algumas cidades já adotaram a telemedicina como parte da estratégia de saúde pública. No Rio de Janeiro, um projeto piloto da prefeitura em parceria com o Ministério da Saúde, a Fiocruz e uma ONG local está levando as consultas online até moradores de comunidades da Maré. Com o apoio de mobilizadores sociais que orientam os moradores sobre o serviço, a fila de espera na unidade de saúde da região foi reduzida em 20%.
Casos como esse demonstram o impacto positivo da telessaúde, especialmente quando há integração entre tecnologia, comunidade e sistema de saúde. A prática permite resolver questões simples, como reemissão de receitas ou orientações clínicas, sem que o paciente precise sair de casa — o que representa um ganho de tempo e qualidade de vida.
Caminho promissor, mas com barreiras
A telemedicina tem se mostrado uma aliada poderosa na ampliação do acesso à saúde, especialmente em um país com dimensões continentais e forte desigualdade regional como o Brasil. Contudo, seu avanço depende diretamente de políticas públicas eficazes, investimentos em infraestrutura e capacitação das equipes locais.
Com os investimentos prometidos e a consolidação das leis que regulamentam a prática, espera-se que a saúde digital se torne uma realidade para mais brasileiros nos próximos anos. O desafio agora é garantir que as tecnologias cheguem onde são mais necessárias — e que nenhum cidadão fique para trás no processo de transformação da saúde pública.